240622 - DÍGRAFOS: ORIGENS DOS DÍGRAFOS COM «H»

 

Ilustração: Dado de 12 faces - Marco Agÿar

 

            Segundo o linguista suíço Ferdinand de Saussure (1857- 1913), fonema é a soma das impressões acústicas e dos movimentos articulatórios da unidade ouvida e da falada, das quais uma condiciona a outra. Em uma simplificação é som gerado quando falamos/ouvimos dois ou mais grafemas com um único som. Esta é a característica dos dígrafos. Um dígrafo (também chamado de digrama) é um par de caracteres usados na ortografia de uma linguagem, escritas como um único fonema (som distinto) ou uma sequência de fonemas que não corresponde aos valores normais dos dois caracteres combinados. Do grego antigo «δίς» (dís, "duplo") e «γράφω» (gráphō, "escrever"). Nesta postagem eu não falarei de todos eles, mas destacarei os que acompanham a letra «H». Nos anos 1970, quando ainda estava nos bancos escolares da Escola Municipal Deodoro (ainda no Estado da Guanabara que mesclou prefeitura municipal com governo estadual em uma única administração) me lembro do professor de português comentar sobre a questão da letra «H» se referir como «helênica» ou seja, indicar que aquela letra que a antecede seja um som grego. Décadas depois resolvo buscar a origem. 

 

            No livro « The Story of Writing», escrito pelo inglês Andrew Robinson (1995) encontro uma vaga menção sobre o caso. Os romanos tinham a mania de copiar as ideias gregas e importaram muitas palavras para o latim. Porém o alfabeto romano tinha uma forte influência grega e etrusca. Ainda assim os romanos gostavam de pegar praticamente tudo dos gregos, incluindo muitas de suas palavras, então eles precisavam de uma maneira de transliterar adequadamente o alfabeto grego, incluindo seus sons aspirados: θ (theta, um “t” aspirado), Φ (phi, um “p” aspirado) e Χ (chi, um “k” aspirado). As letras «theta θ» passou a ser escrita como TH, a «Rô -  ρ» como RH, a « φ – phi» como PH (apesar do latim já ter a «F»), a « χ -Ksi» como CH (nesse caso a letra «C» inicialmente tinha o som de «K», por exemplo “Cicervs” se lia como “Kikerus” e não “Sissero” como hoje). 

 

            Pronunciar palavras emprestadas do grego “corretamente” (isto é, como em grego) em latim era considerado uma coisa muito elegante de se fazer - tanto que uma das características do sotaque romano estereotipado (e especialmente satírico) da classe alta incluía a pronúncia excessiva de vários sons gregos, especialmente os aspirados. (As letras “Y” e “Z” foram adicionadas com o propósito de transliterar o grego, razão pela qual vêm no final do alfabeto latino: «XYZ».). Porém na atualidade muitos dígrafos sofreriam alterações no latim vulgar e que chegaria as atuais línguas neolatinas. O dígrafo CH como vimos vem do X (ksi) grego. A palavra «eucaristia» vem do latim eclesiástico «eucaristia» que é derivado do grego «εὐχαριστία» (eukharistía). Porém ocorreria um problema. O CH mudaria sua pronúncia no Francês, Espanhol e Português. Ninguém fala «charrete» como «karrete» (pequeno carro). O CH passa ter o som como na pronúncia portuguesa do X para /Xarope/. 

 

            Por isso os dígrafos LH e NH tem dois grafemas (caracteres, letras) com um único som, um único fonema. Porém estes também não têm origens no grego antigo e na releitura romana. Trata-se de adaptações do espanhol LL (LH) e Ñ (NH). Importante observar que o dígrafo «SH» comum em palavras inglesas vem de origem escandinava, do trígrafo «sch» comum em alemão (ex.: Schick» que os franceses adotaram como «chic» e calhou no português «chique». Uma outra coisa é que na língua portuguesa são poucas as palavras com trígafos como o caso da palavra «tchau» (adaptada do italiano «ciao») e de «tcheco» (aportuguesamento de «Česko» - leia como /Tiés-Co/). Existem outros dígrafos, mas fiquei restrito aos que tem «H». Apesar da influência grega, deste povo helênico, esse H é apenas uma mera coincidência. CH não é C Helênico e nem PH é P Helênico. 

 

 


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